
O que faz um ser perturbado com os seus tormentos putrefatos, além de transbordar na literatura, versos suavementes desenhados, com sabor caótico do cemitério.
O mineiro de Ervália, Milton Rezende, sabe bem como conduzir o leitor para o mundo orgástico das sombras sobrenaturais, do ruído das tumbas, com a sagacidade de quem está imerso em solidão literária.
Anímica me fez refletir: como seria a minha visita ao meu próprio túmulo daqui há cinquenta anos?
Ou talvez como seria a visita de meu antepassado ao túmulo de uma figura onde ele jurou amor eterno, mas a perdeu para a tuberculose.
Vi e mergulhei nas milhões de possibilidades a cerca da cadavérica missão de seguir em frente, página por página.
Como transbordar sensações transmutaveis?
Como antever o próprio enterro?

Anímica nos traz serenamente a esse mundo que poderia ser considerado nefasto, mas que remete a uma leitura suave, fluída, assim como todo livro de Resende.
Ele transmuta condições eternas, com a cadavérica missão de segurar o leitor de poema a poema.
Até que chega as traduções de seus versos para o espanhol e o inglês, outro ponto mágico do livro.
Nos poemas sequenciais fica evidente a forma que o escritor brinca com temas por ele definido.
Tão fluido.
Tão visceral.
E o livro acaba com a sua já conhecida prosa poética, onde mergulha nos nuances de criação literária, para um escritor solitário, tão solitário como os seus adorados leitores.
Anímica é o segundo livro que leio de Milton Rezende. O primeiro foi A Casa improvisada, também da Penalux, casa onde ele já possui seis publicações.
Onde ficaria o meu espectro nesta altura? Sim, certamente fazendo uma vigilha na tumba do meu pai, onde amanhã os seus ossos serão exumados.